quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

O Caminho das vacas - 021


Acredito que sempre a mãe natureza nos ministra aulas de comportamento saudável no pleno convívio com suas infinitas benesses.  Quando a agredimos, transgredindo seus ditames, são desagradáveis as decorrências, e possuímos abundantes exemplos de pecados contra seus princípios.  Mas, invariavelmente, atribuímos resultados físicos (tangíveis) a estas nossas falhas, como o desmatamento, poluição ambiental e tantas outras.

Eu não havia imaginado que tais ensinamentos poderiam exceder à materialidade e enveredar pela vasta relevância da filosofia. 

Pois, numa ensolarada tarde, após estacionar, estava eu sentado na macia pastagem, na proximidade de um riozinho, a observar as nuvens, os pássaros, os arbustos, as vacas, num lindo e tranqüilo cenário bucólico. 
Encontrava-me leve, a pensar doce, iluminado pela “Pachamama”, a deusa inca da natureza fértil.

A multi tonalidade do verde, aliado aos sons da natureza, estimulam sua compreensão
Eu observava as vacas caminhando através do pasto, abrindo curiosos sulcos aparentemente desorientados. Elas não acompanhavam a topografia plana e iam partindo em ângulo até um velho ipê, contornando-o pelo lado errado, seguindo em arco pelo canto interno da cerca até uma velha porteira, sempre aberta.  
Depois seguiam por espaços entre grandes pedras, quando numa reta poderiam desviá-las, mudando bruscamente o rumo até uma cerejeira-do-mato e descendo até o riacho em sinuoso percurso...

Comportadas e sempre em fila, já foram centenas de vezes, aprofundando estas serpenteadas trilhas, até o bebedouro, saciar suas sedes..

Respeitosamente, uma atrás da outra, sem qualquer tentativa de ultrapassagem ou de deslocamento paralelo.   Em alguns lugares, tais caminhos formam sulcos profundos, com até um palmo de desnível. 

Tal percurso fez-me lembrar do belíssimo trecho sinuoso entre Briançon e Montgenèvre (França)...
Algumas vezes caminhei por estas trilhas, indagando-me sobre as razões de tais curiosas escolhas.   Em linha reta, qualquer um ponderado humano, teria chegado ao riacho na metade da distância.  Racionalmente, traçaríamos o caminho com os olhos fixos no objetivo, seguindo diretamente para ele, de forma mais evidente, com menor perda de energia.

...antagônicas às extensas e retilíneas estradas patagônicas
Ponho-me então a rever minha própria vida, meus pontos de partida e as voltas que dei nesta tortuosa e longa jornada de mais de meio século.  Parece-me então, que foram justamente os aparentes e supostos desvios de rota - jamais de conduta - que trouxeram sabores e cores aos meus percursos.  Concluo que a questão é escolher, sempre respeitados os princípios morais e éticos, priorizando a importância da jornada sem desvalorizar o objetivo.

Passo a conceber que, as metas e os propósitos não devem ser vislumbrados em enfoque retilíneo, assim como nossas ações e esforços não devem seguir hirtas rotas projetadas e inflexíveis.   

A aparência retilínea das premeditadas ações, não são, necessariamente, seus melhores e mais iluminados caminhos.


“O imenso prazer da chegada curva-se perante a majestade do percurso”
Vejo agora que, somente as mentes estreitas e limitadas em suas experiências de vida, procuram seguir inexistentes e impraticáveis obscuras linhas retas, que unem os interesses aos objetivos, sem permitir desvios para usufruir sombras ou admirar flores no caminho. 
O tempo me ofereceu subsídios para concluir que “o imenso prazer da chegada curva-se perante a majestade do percurso”.
Darlou D’Arisbo
Since 1947






Nenhum comentário:

Postar um comentário